Como os atuais juros elevados trazem prejuízos à educação brasileira, em especial, no Ensino Superior? Celso Niskier fala a respeito na Coluna Ensino Superior
Juro. Quatro letras que, juntas, formam um substantivo masculino bastante presente na vida do brasileiro. Para além da gramática, seus efeitos práticos são inúmeros – e incidem tanto na micro quanto na macroeconomia. Geralmente utilizada como estratégia para conter a inflação em contextos de consumo desenfreado, nos últimos meses a taxa básica de juros tem tido grande visibilidade entre as pautas políticas e econômicas, com destaque para o embate entre o governo federal e o Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central.
Dono da maior taxa básica de juros reais do planeta, fixada em altíssimos 13,75% ao ano, o Brasil encontra-se em um cenário paradoxal, já que estamos muito longe de um momento de pleno consumo. Pelo contrário, ainda tentamos nos recuperar da grave crise econômica dos últimos anos e estamos diante de um cenário internacional de muito mais incertezas do que de projeções animadoras de crescimento.
E como esses juros elevados trazem prejuízos à educação brasileira?
Embora, à primeira vista, os impactos mais evidentes sejam em mecanismos que fazem a engrenagem da economia girar de forma imediata, eles não ficam restritos a esse universo. Muito pouco, para não dizer nada, tem sido debatido sobre os desdobramentos dos juros altos para a formação educacional da nossa população, em especial as classes menos favorecidas. Vivemos em um país no qual um contingente enorme de pessoas precisa de financiamento público e privado para conseguir acessar a educação superior, e a união das altas taxas de juros à retirada, ocorrida nos últimos anos, do caráter social do programa governamental de financiamento estudantil é o que se pode chamar de “a pá de cal” no sonho da graduação para milhões de cidadãos.
Na outra ponta, o crédito caro compromete a saúde financeira das instituições de educação superior, em especial das pequenas e médias. Aliás, para essas IES, as elevadas taxas de juros também incidem em outra área fundamental para a sustentabilidade delas: a capacidade de inovar, já que recursos especialmente destinados para este fim, e com condições especiais de contratação, estão cada vez mais escassos e disputados. Ao analisar o quadro geral, mas que também se aplica à educação, a jornalista Miriam Leitão foi categórica ao ressaltar que as empresas estão pagando cerca de 20% de juros ao ano em suas linhas de crédito. “É inviável, vão quebrar”.
Por fim, os juros elevados comprometem a formação educacional e o futuro de milhões de brasileiros quando, ao desacelerar a economia, impacta na geração de empregos, desestimulando os jovens de investirem na carreira, seja na busca por progressão profissional, seja na busca por uma nova área de atuação. Na outra ponta, os juros altos pressionam o valor da mensalidade estudantil, ao tempo em que a desaceleração impacta negativamente na renda das suas famílias, dificultando ainda mais o acesso. É importante lembrar que os dados oficiais mostram que mais de 80% dos estudantes da rede particular de ensino, em todos os seus níveis, são das classes C, D e E.
Dessa forma, para além dos impactos imediatos no ciclo econômico, a manutenção de uma taxa básica de juros nesse patamar compromete de forma significativa nossas expectativas de progresso socioeconômico a curto e médio prazos. Hoje, o país precisa de um mercado forte, competitivo e aquecido para garantir condições dignas e qualidade de vida para a sua população. E precisa assegurar a construção das bases para um futuro mais próspero e justo para cada brasileiro.
Economia e educação estão unidas em níveis muito mais profundos do que costumamos considerar. Aliás, é comum atribuirmos à educação a responsabilidade pelo desenvolvimento almejado, mas poucas vezes fazemos o caminho inverso. Nesse sentido, é preciso que o diálogo com o governo amplie a atenção das políticas econômicas e seus impactos na educação. Esse é um cuidado que resultará em benefícios para os dois lados da balança e reduzirá descompassos como o que tem sido ocasionado pela descabida taxa de juros atual. Nós, da ABMES, estamos de olho.
Diretor-presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) e secretário executivo do Brasil Educação – Fórum Brasileiro de Educação Particular, além de membro do Conselho Consultivo da Bett.