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Na Coluna Engenharia Educacional, Marcel Costa mostra como o professor do século 21 vai além do conteúdo e atua como curador da aprendizagem

Nos corredores e salas de aula, cada olhar, gesto ou silêncio dos estudantes carrega informações tão valiosas quanto as respostas de uma prova. A docência do século 21 exige mais do que domínio de conteúdos: pede uma presença atenta, capaz de reconhecer que o aprendizado floresce quando o equilíbrio emocional encontra a excelência cognitiva. Nesse cenário, o educador-professor se torna não apenas transmissor de saberes, mas curador de emoções e conhecimentos.

Ser curador é ajustar o ritmo da aula não apenas ao conteúdo planejado, mas às necessidades e capacidades que emergem da turma em tempo real. Isso significa perceber sinais sutis de ansiedade, cansaço ou entusiasmo e modular a experiência de aprendizagem. Ao contrário da crença persistente de que apenas longas horas de estudo garantem sucesso, a qualidade da experiência, sustentada por segurança emocional e motivação, é determinante para o desenvolvimento acadêmico e pessoal.

Mas reconhecer essa necessidade é apenas a introdução. A questão central é: como implementar isso na prática?

O caminho mais comum é seguir o roteiro rígido: falar, explicar, avançar no conteúdo, dar a prova e medir o resultado. Porém, todos sabemos que muitas vezes o aluno não absorve o suficiente e o professor se vê diante de um dilema: facilitar a prova, mascarando a dificuldade real, ou endurecer, forçando na base do medo. Ambas as saídas são paliativas. A primeira transfere o problema adiante; a segunda pode até gerar resultados numéricos, mas às custas de estresse e desgaste emocional.

Existe, no entanto, uma terceira alternativa. Ela exige um pouco mais do professor, mas também devolve mais em troca. Consiste em criar um ambiente de interação, rompendo com o formato unilateral de “eu falo, você escuta”. Significa aproximar-se da turma, colocar-se ao lado dos alunos e tornar o conteúdo uma narrativa envolvente. Não no sentido literal de “história de ninar”, mas num paralelo: uma história que convida à participação, que faz cada estudante se perceber peça fundamental no enredo. Assim, o conteúdo deixa de ser algo imposto e passa a ser algo esperado, quase como um capítulo seguinte de uma série que não se quer perder.

Isso não é entretenimento barato nem obrigação de acompanhar modismos. O paralelo não é infantilização: trata-se de humanizar a relação. Se são adolescentes, fale a verdade a eles. Compartilhe por quê aquele conteúdo fez diferença na sua vida ou como pode impactar a vida deles. Não é preciso contextualizar tudo o tempo todo, mas sim selecionar pontos estratégicos que criem pontes reais. Muitas vezes, para resolver uma lista de exercícios, o aluno precisa de cinco ou seis habilidades específicas. O quanto de explicação sem vínculo poderia ser reduzido em favor de exemplos mais tangíveis, que realmente os aproximem da competência necessária? Essa simples mudança pode transformar desmotivação em engajamento.

Na prática, ser professor-curador é menos complicado do que parece. Basta quebrar a rotina de vez em quando. Experimente variar o tom de uma aula repetida há anos, propor um desafio inesperado, ouvir mais e falar menos em determinados momentos.

O aluno motivado pode avançar muito além do que se imagina com um gesto de reconhecimento, um feedback genuíno de que ele é importante e que sua presença conta. Sem isso, sobra apenas o caminho do medo. E é justamente esse caminho da obrigação sem significado, da cobrança sem vínculo que explica por que tantas salas de aula ainda estão presas em um ciclo de cansaço, evasão e desinteresse.

A escolha, portanto, está posta: ou seguimos sustentando um sistema que fabrica estresse e produz pouco aprendizado real, ou ousamos experimentar essa terceira via, onde o professor deixa de ser apenas transmissor de conteúdo e assume sua função de curador de emoções e de conhecimentos. A primeira opção nos leva ao esvaziamento da sala de aula; a segunda, ainda que exija mais, abre a porta para uma educação viva, significativa e transformadora.

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