A diretora do GayLussac alerta para limites da gamificação na educação e defende o uso intencional de jogos como eixo da aprendizagem, não como recompensa
A gamificação na educação tornou-se uma tendência acelerada nas escolas, impulsionada por plataformas digitais, metodologias ativas e pela promessa de mais engajamento. Porém, ao transformar etapas da rotina pedagógica em missões, rankings e recompensas, cresce o risco de reduzir a aprendizagem a um sistema de trocas. Para Luiza Sassi, psicopedagoga e diretora-geral do Colégio GayLussac, esse movimento exige atenção redobrada.
A educadora afirmou que gamificação e jogos digitais são conceitos diferentes. E que a confusão entre eles tem levado escolas a reforçarem caminhos pouco pedagógicos. Gamificação consiste em aplicar mecânicas de jogos a atividades que não são jogos. Já o uso de jogos digitais implica aprender dentro de um ambiente lúdico estruturado, criado para provocar desafios cognitivos reais.
Essa distinção é essencial para orientar decisões pedagógicas. “Aprende-se para se constituir como ser, e não para ganhar recompensas”, afirmou Luiza Sassi. A lógica dos games pode apoiar o engajamento, mas não substitui a intencionalidade docente nem o vínculo do estudante com o ato de aprender.
No GayLussac, o debate ocorre em outra camada: a da cultura escolar. A instituição mantém uma biblioteca de jogos de tabuleiro e desenvolve projetos de programação de jogos digitais nas aulas de Pensamento Computacional, incentivando criatividade, raciocínio lógico e cooperação. Nessas experiências, o jogo é parte do processo, não um adereço motivacional.
Assim, a visão da diretora abre espaço para um olhar mais crítico sobre o avanço da gamificação na educação. Em vez de aderir a modismos ou soluções rápidas, ela propõe que gestores avaliem se a abordagem realmente sustenta o projeto pedagógico . Ou se apenas imita tendências de mercado.
Jogos fortalecem pensamento, estratégia e habilidades sociais
Jogos analógicos e digitais têm papel consolidado no desenvolvimento cognitivo e socioemocional. Na opinião da psicopedagoga, ampliam a capacidade de planejar, testar estratégias, lidar com frustrações e reorganizar o pensamento. Essa experiência completa, com regras, limites e interações sociais próprias, cria um ambiente fértil para a aprendizagem.
Além disso, jogos estimulam comportamentos essenciais para o século 21, como cooperação, negociação e autorregulação. O estudante aprende a esperar sua vez, reavaliar decisões e trabalhar com hipóteses. Elementos que reforçam autonomia e pensamento crítico.
No GayLussac, essas práticas não são iniciativas isoladas. A biblioteca de jogos faz parte da rotina escolar, enquanto o Clube de Programação de Jogos Digitais ensina linguagens computacionais e promove criatividade e resolução de problemas. Essas vivências ajudam alunos a relacionar intuição, estratégia e reflexão metacognitiva. Luiza Sassi afirma que esse é um caminho mais sólido para engajar e desenvolver estudantes do que recompensas artificiais.
O excesso de gamificação e o risco de confundir inovação com adereço
Quando a gamificação se torna regra, surgem problemas sérios. Luiza Sassi alerta que a lógica de moedinhas, rankings e premiações sem propósito desloca o foco do estudante. “É um erro grave criar meios de motivação a partir de premiações que não têm sentido pedagógico”, afirmou. Esse padrão pode reforçar comportamentos de dependência e criar relação distorcida com a aprendizagem.
A diretora também critica iniciativas do mercado editorial que tentam gamificar cada conteúdo, criando competições sem sentido e sistemas de pontos superficiais. Em vez de incentivar curiosidade e profundidade, essas práticas podem promover ganhos aleatórios que pouco dialogam com o desenvolvimento integral.
Sassi observa ainda outro fenômeno: as “escolas adesivadas”. São instituições que investem em ambientes coloridos, espaços de coworking e estética moderninha, sem mudanças reais nas práticas pedagógicas. “A inovação precisa estar associada a princípios e valores, não a uma moda passageira”, afirmou.
Em um cenário de IA generativa e metodologias ativas, ela reforça a necessidade de políticas claras de uso e de formação contínua. No GayLussac, a IA só é utilizada a partir dos 13 anos, garantindo maturidade para uso crítico. Para Luiza Sassi, usar tecnologia com responsabilidade é parte central de qualquer proposta pedagógica que pretenda inovar — e durar.










