O uso de celulares nas escolas virou fonte de debates: alguns defendem a proibição total, outros enxergam valiosas ferramentas pedagógicas
O uso de dispositivos móveis nas escolas vem promovendo discussões no ambiente educacional. Em questão, a integração dessas tecnologias de forma positiva à dinâmica do aprendizado, sem incentivar a dispersão. Se por um lado há quem argumente que os celulares são uma fonte de distração para os estudantes, que podem prejudicar o próprio desempenho acadêmico e a concentração em sala de aula, por outro é inegável que também podem ser aliados no processo educacional.
“Entendo que, se houver intencionalidade pedagógica, os dispositivos eletrônicos como celulares e tablets são ferramentas importantes para auxiliar o aprendizado. O desafio da utilização dessas ferramentas está, justamente, em aliar o uso pedagógico no dia a dia do aluno e, ao mesmo tempo, evitar a perda do foco e distração”, afirmou a presidente-executiva do Instituto Palavra Aberta, Patrícia Blanco.
Além disso, os celulares e os tablets podem ser utilizados como ferramentas de aprendizagem interativa, estimulando a criatividade, a autonomia e a colaboração entre os estudantes. “Muitas escolas e redes de ensino têm proibido o celular em sala de aula, mas nós alertamos que precisamos pensar em como a educação pode contribuir para o uso qualificado desse dispositivo”, explicou a especialista.
Patrícia vai além, e acrescenta alguns motivos para o uso intencional e mediado de celulares e redes sociais nas escolas:
- Aprender a fazer pesquisas qualificadas: “é preciso conhecer as possibilidades e limitações das novas ferramentas para poder fazer uso adequado delas. O ChatGPT, por exemplo, gera textos coerentes e convincentes, mas que podem ser imprecisos”.
- Aprender a avaliar a informação: “ao navegar pelas redes, os adolescentes devem entender, por exemplo, que a popularidade de influenciadores não necessariamente lhes confere a autoridade de especialistas; e reconhecer a necessidade de verificar a informação antes de compartilhá-la”.
- Conhecer o funcionamento dos ambientes algorítmicos: “é preciso entender por que vemos o que vemos na internet. Isso significa problematizar o funcionamento das decisões algorítmicas que regem nosso acesso à informação e nossas interações”.
- Observar as relações de poder por trás da tecnologia: “os sistemas tecnológicos tendem a reproduzir assimetrias de poder. É o caso, por exemplo, de IA’s treinadas com dados pouco representativos da diversidade presente na sociedade. Os jovens devem aprender a questionar seu funcionamento e identificar a que interesses servem essas tecnologias, que podem ampliar desigualdades ou mesmo silenciar determinadas visões de mundo”.
- Praticar o uso positivo: “além de condenar o bullying e as agressões, podemos ajudar os jovens a identificar os aspectos positivos da internet, e direcionar seu uso para isso”.
Tema será abordado em palestra na Bett Brasil
Com acesso à internet e a uma infinidade de aplicativos educacionais, os alunos têm a oportunidade de ampliar seus conhecimentos, pesquisar informações, colaborar em projetos e desenvolver habilidades digitais essenciais para o século 21. Os dispositivos podem, também, facilitar a comunicação entre alunos, professores e famílias, promovendo uma maior integração e envolvimento na comunidade escolar, dizem os especialistas.
Por meio de mensagens, grupos de estudo e plataformas de ensino online, é possível estabelecer uma rede de apoio e troca de informações que contribui para a construção de um ambiente educacional mais dinâmico e participativo. Mas a utilização excessiva de celulares pode gerar problemas de saúde, como dores musculares, lesões oculares e distúrbios do sono, devido à postura inadequada e ao tempo prolongado em frente às telas.
Essas questões levantam preocupações sobre o impacto negativo que o uso indiscriminado de celulares pode ter na saúde e no bem-estar dos estudantes, ressaltando a importância de estabelecer limites e orientações claras sobre o uso desses dispositivos.
“Sobre como integrar de forma positiva, acredito que a primeira questão é que os professores precisam estar inseridos na cultura digital. É muito importante que eles utilizem as ferramentas e que percebam o quanto podem potencializar o ensino. Então, quanto mais professores com formação digital tivermos, melhor para o todo ambiente, pois assim criamos uma rede de pessoas preparadas para usar tecnologia”, explicou o diretor de tecnologia educacional do Colégio Bandeirantes, Emerson Bento Pereira.
Patrícia Blanco e Emerson Bento Pereira serão os palestrantes do painel “Conectividade na educação: celular na sala de aula – Sim ou Não?”, durante a Bett Brasil. O maior evento de Inovação e Tecnologia para Educação na América Latina será realizado de 23 a 26 de abril, no Expo Center Norte, em São Paulo. O educador21, parceiro de produção de conteúdo e apoiador do evento, realiza uma ampla cobertura, pré e pós Bett, trazendo todos os insights dos temas em alta nas discussões do meio educacional. Acompanhe nas nossas redes e confira mais detalhes sobre a Bett Brasil 2024 na seção “Especial Bett”, no nosso portal.
O papel da escola: promover o uso consciente e sem excessos
Diante desse cenário é fundamental encontrar um equilíbrio entre o uso consciente e responsável dos celulares, garantindo que esses dispositivos sejam utilizados de forma produtiva e benéfica para o processo de ensino/aprendizagem. Para isso, é essencial promover a conscientização dos alunos sobre os impactos do uso excessivo de celulares, incentivando a reflexão sobre seus hábitos e comportamentos online. Como é o caso do Bandeirantes, colégio paulistano que desde 2013 utiliza dispositivos em sala de aula com os alunos, porém, com normas para o uso consciente e sem excessos.
“Desde 2013, passamos a entender que era importante fazer o que hoje chamamos de transformação digital. Depois da pandemia, quando o uso de tecnologia ficou muito mais intenso, passamos a adotar o tablet, também, para o ensino médio. Atualmente, chegamos a ter 3.600 máquinas conectadas simultaneamente em nossa rede, mas não incentivamos o uso de celular. Inclusive, pedimos para que os alunos deixem o celular na mochila, de preferência desligado”, explicou Emerson.
O diretor ressaltou a importância de as escolas desenvolverem políticas e diretrizes claras sobre o uso de celulares em sala de aula, estabelecendo regras e limites que respeitem tanto a necessidade de acesso à tecnologia quanto o ambiente de aprendizagem. “Há mais de dez anos, o Bandeirantes oferece o tablet para todos os professores e, com isso, eles se apropriaram dessa tecnologia. E quando isso acontece fica muito mais tranquilo e fácil para a escola. Procuramos incentivar a busca por novas ferramentas, o que faz com eles aprendam muito e, quando percebemos, já existem várias ações acontecendo na escola usando a tecnologia” completou Emerson.
Os professores desempenham um papel fundamental nesse processo, utilizando os celulares como recursos pedagógicos e integrando-os de forma criativa e significativa nas atividades escolares. “O que é importante reforçar é que não podemos demonizar o uso e, sim, apoiar o aluno para que ele desenvolva a capacidade crítica e possa ter uma experiência fortalecedora do uso da tecnologia, tanto dentro da escola como fora dela”, afirmou Patrícia Blanco.