Na primeira infância, o papel do educador é central para o desenvolvimento cognitivo, socioemocional e para a construção da identidade infantil
Maria Clara Alves*
O brasileiro médio não compreende a importância da primeira infância. O dado foi revelado por um levantamento da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal em conjunto com o Datafolha. Segundo a pesquisa, 84% da população brasileira não considera os anos iniciais como fundamentais para o desenvolvimento humano. Esse é um grande equívoco.
A primeira infância – do nascimento aos seis anos – é um período fundamental no desenvolvimento emocional, cognitivo, motor e social. É nessa época que a criança começa a adquirir habilidades que serão fundamentais ao longo de toda a vida, como ampliação de vocabulário, capacidade de aprender a se comunicar e expansão de relacionamentos para além de seus familiares.
Durante essa idade, há um importante papel das escolas e creches. O Global Report on Early Childhood Care and Education 2024, feito pela UNESCO e que levanta dados sobre a primeira infância e a educação, destacou que crianças que frequentam programas de educação infantil têm mais chances de estar no caminho adequado para o desenvolvimento, demonstrando os benefícios de investir em programas de aprendizagem na primeira infância.
Nesse contexto de crescimento e formação, um agente desempenha papel crucial ao ajudar a conduzir o processo sem tirar o protagonismo dos pequenos: o professor. A função dele vai muito além de acompanhar as crianças ou passar atividades. Na realidade, o papel do educador infantil exige uma grande polivalência, observada em todos os momentos da rotina escolar.
Eles são responsáveis por integrar conteúdos, cuidar, acolher, mediar, planejar e avaliar seus alunos pedagógica e integralmente, garantindo o bem-estar físico e emocional das crianças.
Um artigo publicado em 2023 na revista Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação, revela que os professores da educação infantil são essenciais no desenvolvimento infantil socioafetivo no ambiente escolar, já que são intermediadores do ambiente escolar, onde ocorrem interações constantes, que permitem a troca de percepções, ideias e valores. Assim, eles dão espaço para a construção de importantes habilidades socioemocionais dos pequenos, como o respeito às diferenças e o trabalho em grupo.
Mas os professores da Educação Infantil têm em suas mãos uma responsabilidade que vai além do pedagógico: são referência e exemplo, contribuindo na construção da identidade e da autoestima dos pequenos.
Durante a primeira infância, o cérebro da criança faz milhões de conexões neurais que são influenciadas pelas interações com seus professores por meio do afeto, do vínculo, do brincar e da escuta ativa. Suas atitudes, falas e exemplos ajudam a construir o ser que está em formação. Os pequenos observam e imitam o educador que está oferecendo moldes de comportamentos, valores e gestão das emoções.
Por isso é tão importante que os educadores infantis saibam construir um vínculo humano e de proximidade com os seus alunos. Até porque o fortalecimento desse vínculo, somado ao cuidado, carinho e iniciativas com intencionalidade pedagógica, faz com que a criança se sinta cada vez mais segura de si, valorizada como indivíduo, compreendida e pertencente àquele espaço e à sociedade.
Gerar e nutrir esse vínculo proporciona um ambiente emocional favorável para que ela desenvolva habilidades que levará para a vida, como empatia, capacidade de pensar diante de situações desafiadoras e conflituosas e regular e nomear sentimentos.
Se tornar este exemplo é o verdadeiro desafio da profissão, mas o segredo está na intencionalidade pedagógica das atitudes do dia a dia, como mencionei há pouco. Pequenos momentos na rotina são uma ótima oportunidade para que os educadores saibam se posicionar como referências. Durante a alimentação, por exemplo, o professor pode trabalhar a autonomia – permitindo que a criança coma sozinha, a ampliação do vocabulário – nomeando os alimentos, incentivar hábitos saudáveis, explorar diferentes texturas e ampliar o paladar – oferecendo diferentes alimentos, entre outros.
É importante destacar que não há receita de bolo para ser um professor de Educação Infantil habilidoso. É preciso olhar atento, compreensão da infância, do desenvolvimento de cada fase em suas diferentes dimensões – física, emocional, social e cognitiva. O educador precisa passar por vivências práticas em espaços educativos para realizar observações, experimentar e refletir sobre diferentes práticas e contextos pedagógicos e garantir que esteja sempre aprendendo.
Por fim, é importante ressaltar que o professor da Educação Infantil é, antes de mais nada, um ser humano. Ele também enfrenta uma série de desafios, como o cansaço físico e emocional. Além disso, junto com as preocupações com os pequenos, eles ainda lidam com a sobrecarga de planejamento das atividades, a exigência da elaboração de relatórios, reuniões pedagógicas com equipe e com os pais, além, muitas vezes, da falta de apoio e compreensão das famílias. Tudo isso em um contexto de baixa valorização profissional e turmas cheias, como acontece em grande parte do nosso país.
Mesmo que muitos repitam que professores são super-heróis, eles são essencialmente humanos, como as crianças, as famílias, eu e você. E é justamente sendo humano, no sentido mais literal da palavra, que ele se torna um ponto de referência para os pequenos.
Neste mês do professor, deixo aqui o meu reconhecimento e minha profunda admiração a todos que se dedicam a transformar a vida das crianças por meio da educação e do acolhimento.
_*Coordenadora de Ensino Infantil e Fundamental – Anos Iniciais da rede de escolas _Anglo Alante










