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Como escolas, docentes e políticas públicas buscam preservar vínculos e atenção na educação básica em meio ao avanço da tecnologia e da IA

Romulo Duarte*

A educação básica vive um dos momentos mais desafiadores de sua história (até agora). De um lado, a presença cada vez mais intensa da tecnologia e da inteligência artificial redefine o papel da escola, do professor e do próprio conhecimento. Em paralelo, debates sobre políticas públicas que buscam regular o uso dessas tecnologias reforçam a busca pelo equilíbrio entre inovação, atenção e convivência.

Em especial, com a recente comemoração do Dia do Professor (15 de outubro), é importante refletir sobre a intensa transformação que esses profissionais enfrentam em sala de aula, em paralelo com as mudanças geracionais.

Mais do que desligar o celular, é preciso reconectar pessoas

Nunca foi tão difícil conquistar a atenção de uma criança. O tempo de concentração diminuiu, a curiosidade tornou-se fragmentada e o imediatismo das redes redefine o que significa aprender. Por isso, a grande questão que se coloca não é apenas como inserir tecnologia na escola, mas como resgatar o sentido da experiência do aprendizado como um todo.

A recente Lei nº 15.100/2025, que restringe o uso de celulares em espaços escolares, surgiu nesse contexto de urgência. A medida busca proteger a saúde mental e emocional dos estudantes, ao limitar o uso pessoal de smartphones em sala, no recreio e em outros espaços coletivos.

Os primeiros resultados foram expressivos e apontam para a validade da medida: mais de 80% dos estudantes brasileiros afirmam prestar mais atenção nas aulas após a proibição. O impacto é ainda mais evidente no Ensino Fundamental I, onde 88% dos alunos disseram estar mais concentrados. No Ensino Médio, a melhoria na atenção foi relatada por 70% dos estudantes.

A mesma pesquisa, conduzida pela Frente Parlamentar Mista da Educação em parceria com o Lemann Center da Stanford University (2025), também revelou uma queda perceptível na violência digital: 77% dos gestores e 65% dos professores perceberam uma redução nos casos de bullying virtual.

Os números, embora positivos, não bastam sozinhos. Eles apontam para uma evidência maior: a escola precisa reforçar seu papel como espaço de convivência e foco, não como um território de proibições, mas como um ambiente de redescobertas e de criação de novos vínculos.

Em busca do ponto de equilíbrio

Ao mesmo tempo em que limita o uso de dispositivos pessoais, o Brasil avança em políticas que estimulam a inovação digital no ensino, como a Educação Conectada (PIEC) e a Política Nacional de Educação Digital (PNED). Essas iniciativas reconhecem que a tecnologia é uma aliada poderosa quando usada com intencionalidade pedagógica e não como distração.

A chegada da inteligência artificial intensifica essa ambiguidade. Ferramentas capazes de gerar textos, resolver problemas e personalizar trilhas de aprendizagem trazem ganhos reais de eficiência, mas também exigem uma revisão ética e metodológica profunda. Como formar estudantes críticos se o conteúdo já chega pronto? Como ensinar autoria, reflexão e empatia em meio à automatização?

A resposta para essas perguntas passa por um modelo híbrido mais consciente, que equilibra momentos digitais e presenciais, e entende que educar é, antes de tudo, criar vínculos.

Possibilidades para o Ensino Híbrido

Segundo pesquisa da Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação), durante a pandemia, mais da metade das redes municipais brasileiras (52,7%) recorreram ao ensino híbrido para garantir a continuidade do aprendizado. O mundo ideal, entretanto, é um em que o modelo híbrido deixe de ser uma resposta emergencial e se torne uma estratégia estruturante, apoiada em formação docente, curadoria digital e avaliação contínua.

A tecnologia, quando usada com propósito, amplia o engajamento e o desempenho dos estudantes. Plataformas gamificadas, por exemplo, tornam-se aliadas na construção da autonomia e da resiliência, transformando o erro em parte do processo de aprender.

O futuro da educação

No fim das contas, o que está em jogo é o sentido de educar. Mesmo com tantas mudanças estruturais e sociais, a escola continua sendo um espaço onde se aprende a escutar, a esperar, a conviver e a pensar de forma crítica. O futuro da educação básica não depende apenas da tecnologia que adotamos, mas da humanidade que preservamos mesmo em contextos desafiadores.

Apesar do avanço da inteligência artificial, o papel do professor permanece central: é ele quem inspira, orienta e serve de âncora emocional e intelectual no processo de ensino. Sua presença é insubstituível na construção de relações de confiança e no desenvolvimento do pensamento crítico, elementos que nenhuma máquina é capaz de reproduzir.

Afinal, a inteligência artificial pode acelerar processos, mas só a inteligência e sensibilidade humana é capaz de formar cidadãos conscientes, empáticos e éticos. E é essa combinação que definirá o rumo da educação nos próximos anos.

_*Diretor Executivo de Ensino e Pesquisa da _Inspira Rede de Educadores

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