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Competências socioemocionais e saúde mental dos jovens estão interligados, de acordo com especialistas que palestraram na Bett Brasil 2024

A Bett Brasil foi o local escolhido para o anúncio oficial do estudo “Social and Emotional Skills for Better Lives (Competências socioemocionais para uma vida melhor, em tradução livre),” divulgado pelo Instituto Ayrton Senna (IAS). Conduzida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em colaboração com IAS, essa é uma das primeiras pesquisas internacionais em larga escala sobre competências socioemocionais no mundo, abrangendo dados de milhares de estudantes de 10 e 15 anos.

É a primeira vez que o Brasil participa da coleta global de dados sobre o assunto, junto com outros 16 países e organizações, incluindo Colômbia, Chile, Itália, Japão, Finlândia e Bulgária. No Brasil, o estudo foi conduzido na cidade de Sobral, no Ceará, em 2023, com mais de 4.500 estudantes de 10 e 15 anos, professores, diretores escolares e pais/responsáveis.

O levantamento avalia 15 competências socioemocionais e sua importância na vida dos estudantes, além de examinar os fatores que promovem ou dificultam seu desenvolvimento. “Todas as competências socioemocionais analisadas contribuíram para o aprimoramento do desempenho acadêmico, desmistificando a ideia de que o desenvolvimento dessas habilidades poderia prejudicar o aprendizado tradicional”, ponderou Karen Teixeira, gerente de pesquisas e membro do eduLab21, do Instituto Ayrton Senna, que apresentou os resultados no Auditório de Educação Pública da Bett Brasil.

Três áreas ficam evidenciadas pelo estudo:

  • Idade: o estudo evidencia disparidades no desenvolvimento das competências socioemocionais entre estudantes de 10 e 15 anos. Enquanto os estudantes mais jovens demonstraram maior progresso em competências como confiança, determinação, assertividade e otimismo, os de 15 anos relataram um avanço superior na competência de empatia. Essas discrepâncias ressaltam a importância de compreender os elementos que influenciam tal desenvolvimento.
  • Frequência escolar: o relatório também aborda a questão da frequência escolar, destacando que os estudantes de Sobral têm menos faltas em comparação com a média dos países participantes, embora relatem chegar atrasados à escola com maior frequência.
  • Notas escolares: entre os resultados mais relevantes, competências como desempenho de tarefas e abertura ao novo estão relacionadas com melhores notas escolares; a autogestão e curiosidade foram relevantes como os principais impulsionadores do desempenho em disciplinas como matemática, leitura e artes; enquanto otimismo e entusiasmo influenciam positivamente o bem-estar dos estudantes.

O Instituto Ayrton Senna é referência no país com atuação importante na promoção do debate e na condução de pesquisas sobre habilidades socioemocionais no Brasil. Seu trabalho contribuiu para a inclusão dessas competências nos currículos escolares da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), um marco histórico para a educação brasileira. Uma hipótese sugerida pela gerente de pesquisas e membro do eduLab21, do Instituto Ayrton Senna, Karen Teixeira, é que os estudantes de 10 anos, especialmente aqueles no ensino fundamental 1, desfrutam de uma relação mais próxima com um único professor, o que pode facilitar o progresso socioemocional.

“Professores do ensino fundamental 1 podem ter acesso a mais formações relacionadas ao desenvolvimento socioemocional, tornando-os mais preparados para ajudar os alunos nessa área. Esses insights sugerem a importância de fornecer formação adequada aos professores do ensino fundamental para melhorar o desenvolvimento socioemocional dos alunos mais velhos”, afirmou a gerente de pesquisas durante a apresentação na Bett Brasil.

Karen Teixeira destacou, ainda, a importância de observar essa tendência: “A incidência de faltas e atrasos é crucial, pois pode ser um indicador de possível abandono escolar e afetar o desempenho dos alunos. Competências como determinação, persistência e responsabilidade contribuem para a redução das taxas de faltas e atrasos. Além disso, competências como otimismo e entusiasmo estão associadas a indicadores de saúde e bem-estar.”

Saúde mental na Bett: preocupação maior entre os jovens

As competências socioemocionais como parte fundamental da saúde mental foi o tema abodado pela psicóloga e gerente pedagógica do LIV (Laboratório Inteligência de Vida), Renata Ishida, e a psiquiatra e professora da Santa Casa de São Paulo, Maria Carolina Pinheiro em um dos painéis da Bett Brasil 2024.

Segundo Renata, após a pandemia, a sensação nas escolas é de que os desafios emocionais são ainda maiores, com crianças e jovens mais inquietos e com diversas dificuldades socioemocionais. A psicóloga alerta ainda sobre dados alarmantes: segundo o Ministério da Saúde, o número de crianças que usam algum tipo de psicotrópico aumentou 775% nos últimos 10 anos.

Ishida destaca que há um crescimento exponencial no número de diagnósticos de transtornos, porém, o caminho para solucionar esse problema é mais longo do que se pensa. “Não basta diagnosticar. É preciso oferecer caminhos e ferramentas para que as pessoas enfrentem seus desafios de vida, e a escola é fundamental nesse sentido. É preciso estruturar estratégias e práticas de cuidados na rede escolar, e tornar isso um exercício cotidiano de acolhimento”.

“Quanto mais estudo, mais certeza eu tenho que doenças psiquiátricas são doenças pediátricas. É melhor construir crianças inteiras do que adultos quebrados”. A frase da psiquiatra Maria Carolina Pinheiro comoveu a plateia de congressistas. Afinal, grande parte dos gestores e educadores vivem a realidade desafiadora de lidar com traumas e transtornos em crianças e adolescentes nas escolas. Segundo a médica, ao menos 12% dos jovens do mundo possuem ao menos um tipo de transtorno psicológico.

As causas para esse cenário são muitas, mas Maria Carolina lista, principalmente: mudanças sociais bruscas; aumento da pressão acadêmica, familiar e social; excesso no uso da tecnologia; traumas e adversidades; desequilíbrios químicos e hormonais desencadeado por fatores ambientais; condições genéticas associadas a um estilo de vida ruim, entre outros.

De acordo com a especialista, a cura está na transformação dos jovens e no convite à construção da saúde. “Saúde e doença não são opostos. Se adoecemos, é porque estamos recebendo um convite para revermos nossa relação com o mundo. Não devemos sofrer em vão, é necessário discutir e, principalmente, ouvir”, enfatizou.

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