A ideia dos “nativos digitais” perdeu força diante dos impactos das telas, das redes sociais e da falta de supervisão. A educação digital torna-se essencial
Betina von Staa*
O início da minha carreira na Tecnologia Educacional coincidiu exatamente com o advento da Internet, lá pela virada do milênio. Havia muita novidade, reflexões acaloradas sobre o poder dos hiperlinks, acesso fácil a uma infinitude de conteúdo e muita inovação na área da educação: portais, tutoria remota, conteúdos digitais animados, entre muitos outros recursos jamais vistos!
As pessoas buscavam informações, clicavam nos links, enviavam mensagens instantâneas pelo mundo afora, jogavam, ensaiavam o uso de câmeras digitais, enquanto a internet discada emitia seus sons de apito.
Com uma tecnologia de tão fácil acesso (só era preciso computador, monitor, teclado uma mesa e conexão de internet para usar), os jovens, evidentemente, se apropriaram da novidade.
Não tardaram a chegar teorias sobre os Nativos Digitais, muito marcadas pela obra de Marc Prenski (Digital Natives, 2001). Nativos Digitais seriam jovens que foram criados imersos em tecnologia e para quem esse novo mundo seria muito natural. Acreditava-se que bastava dar acesso a tecnologia e aprenderiam como usá-la, desenvolveriam comportamentos multitarefa, descobririam até como montar e desmontar computadores!
Enquanto isso, os imigrantes digitais, adultos, assistiriam perplexos a tanta destreza e eram descritos como novatos, inexperientes e desengonçados neste ambiente tecnológico repleto de esperança.
Confesso que eu sempre defendi o progresso da tecnologia, a inclusão digital, a adoção de tecnologia em contextos educacionais, a viabilização da Educação a Distância online – e ainda defendo.
À sombra desse discurso, no entanto, foram surgindo novas tecnologias ainda mais poderosas: redes sociais! A primeira rede social se chamou Orkut, e defendia que qualquer pessoa do planeta poderia encontrar qualquer outra entrando em contato com apenas 6 conhecidos de conhecidos. Uma promessa de união planetária sem igual! Na sequência: o telefone inteligente, o smartfone, o celular: esse colocou TUDO, os amigos, conhecidos, colegas de trabalho, tarefas de trabalho, câmeras fotográficas, jogos, cartões de crédito, TUDO, na palma da mão!
Os jovens continuavam com liberdade total de uso desses recursos, empoderados pela certeza de que eles conheciam esse mundo melhor do que os adultos (que também os utilizavam).
Lembro de ter dado entrevistas na televisão que chocavam: eu dizia que era perigoso se relacionar via redes sociais, e as reações eram de “ah, mas não é bem assim”; “A gente sabe quem está nos nossos grupos”; “mas não tem jeito, essa é a linguagem do jovem de hoje”.
Em 2011, resolvi escrever um livro. Chamava-se “Eles sabem (quase) tudo”. Era sobre a importância de orientar os jovens a respeito de segurança, ética, bem-estar, busca por conhecimento relevante, visto que eles sabiam apertar botões rapidamente, mas continuavam precisando desenvolver as competências interpessoais. Só para ilustrar, seguem 3 títulos de capítulos deste livro: “O mundo inteiro pode e deve ver… Menos pais e professores”, “Fartura é bom, mas engorda: administrando o tempo” e “O mundo que entra na nossa casa sem convite.”
Bem, o livro não foi um sucesso de vendas. Enquanto isso, fomos criando conteúdos com a linguagem do jovem de hoje: cada vez mais breves, cada vez mais rápidos, repletos de movimento! E, além de ver muito do que não faz bem, a sociedade foi ficando apressada, ansiosa, fragmentada.
E chegamos a 2025: o celular, simplesmente, foi proibido em ambiente escolar! E continuamos precisando saber lidar com o progresso da tecnologia (agora com inteligência artificial), a inclusão digital, a adoção de tecnologia em contextos educacionais, a Educação a Distância de qualidade online.
Qual foi o nosso grande erro? Permitir o desenvolvimento tecnológico? Não! O erro foi achar que crianças e jovens aprendem o que importa sem supervisão. Permitir acesso a informações via redes sociais que seriam proibidos em outras mídias. Aceitar o que a tecnologia nos entrega sem questionar o seu efeito.
A boa notícia é que parece que a sociedade percebeu isso com clareza! O apoio à proibição dos celulares nas escolas revela que se entendeu que os “nativos digitais” não podem tudo. Mas a Educação Digital continua sendo importante! Em uma pesquisa recente que realizamos com 363 respondentes de diferentes partes do país, vimos que: 80% dos respondentes acreditam que é necessário que os jovens aprendam sobre o funcionamento dos algoritmos por motivos profissionais, e mais de 95% acreditam que eles devem aprender aspectos de segurança, ética e bem-estar digital. A importância de descobrir como identificar fake News gerou 90% de respostas positivas.
Adultos, pais, professores têm clareza da importância da educação digital. Provavelmente vão precisar de apoio de “pares experientes”, como diria Vygotski, nesta jornada. O fato é que parece que ninguém acredita mais que “nativo digital” pode tudo!
***Diretora Pedagógica na **BvStaa Tecnologia & Educação










