Fomos ouvir duas educadoras que estarão compondo os painéis de temas do Congresso Bett Brasil 2024 para tentar responder a essa pergunta
Ser educador em um momento incrível da história, no ápice da quarta fase da Revolução Industrial e em meio a um ritmo quase alucinante de transformações tecnológicas, traz ônus e bônus. Especialmente quando isso coincide com uma fase de transição entre as chamadas Era da Informação e Era do Conhecimento — que, por sua vez, colide com uma pandemia global.
Os educadores do século 21 adquiriram fluência tecnológica vinculada, principalmente, à reflexão e ao uso de ferramentas digitais no âmbito educacional e à compreensão da lógica da hipertextualidade característica da internet. Isso porque a Era do Conhecimento é muito mais do que apenas ter acesso à informação. Exige saber interpretar, analisar e aplicar o conhecimento adquirido. Não basta mas memorizar fatos e dados — é preciso ser capaz de relacionar informações de diversas fontes e desenvolver novas ideias.
Nesta nova era, simplesmente ler, ouvir e reproduzir informações não é mais suficiente. É preciso ir além e questionar, refletir, criar conexões, provocar novas perspectivas e aplicar o conhecimento de forma estratégica. Não é mais sobre a quantidade de informações acumuladas, mas sobre a qualidade da capacidade de transformá-las em conhecimento útil.
O professor passa a ocupar um papel de mediador. E precisa estar constantemente se atualizando e se adaptando às adversidades e mudanças do cenário educacional para promover de forma eficaz o processo de ensino-aprendizagem. Junto a tudo isso, deve estar familiarizado com ferramentas digitais e novas tecnologias educacionais, como plataformas de aprendizado online e aplicativos educacionais.
As práticas pedagógicas que acompanhem as mudanças ocasionadas pela tecnologia e a grande diversidade de canais de comunicação e estímulos exigem muito mais do professor. Ele precisa ser um profissional inovador, flexível, adaptável e comprometido em encontrar maneiras eficazes de envolver os alunos e ajudá-los a atingir seus objetivos de aprendizado.
Mas, na teoria, a prática pode ser outra. Por isso, o educador21 foi ouvir quem entende do assunto!
O que é ser um bom educador?
Para Cléa Ferreira, coordenadora do Centro de Formação da Vila, espaço de produção e atualização de conhecimento localizado em São Paulo, definir o que é ser um bom educador é uma questão instigante desde sempre — embora se faça cada vez mais urgente e necessário, tendo em vista as discussões sobre a profissionalidade docente.
“A rigor, a meu ver, essa não é uma pergunta difícil de responder: um bom professor é aquele que consegue assegurar o direito de aprender a todos e a cada um dos seus estudantes, sem deixar ninguém para trás, independente de sua condição social, racial, de gênero, física ou neurológica”, explicou a educadora.
Ao lado de Paulo Emílio Andrade, presidente do Instituto iungo, Cléa estará no painel “Atualmente, o que é ser um bom educador?”, na Bett Brasil 2024, para aprofundar a discussão do tema. Pesquisadora nas áreas de currículo, políticas públicas e formação de educadores, a também professora da PUC-MG frisou que um bom professor é aquele que se entende como sujeito aprendente. O que pode parece fácil, mas não é. “Para que o educador consiga efetivamente garantir a aprendizagem, é preciso que lhe sejam dadas condições institucionais, e isso também será objeto das reflexões que faremos no evento”, ressaltou.
Cléa ainda citou algumas características que considera serem fundamentais a um bom professor, à luz do pensamento de dois educadores que a inspiram: Bell Hooks e Paulo Freire. A disposição para aprender, traduzida em curiosidade investigativa, abertura ao novo e engajamento crítico foi o primeiro ponto defendido pela educadora. Depois, monta um pequeno “combo”, no qual reúne abertura, diálogo e reciprocidade como base das relações. “Isso presume que o educador precisa partir do princípio de que todos temos conhecimentos e experiências e que a sala de aula e todos os demais espaços de aprendizagem da escola são lugares de encontro desses conhecimentos, experiências e sujeitos que têm história, memória e corpos diversos e ricos de possibilidades”, explicou.
Outra característica elencada por Cléa Ferreira é a capacidade de integrar teoria e experiência. Ou seja, de contextualizar o conhecimento de modo que os estudantes possam relacionar o que seria um conhecimento abstrato à sua realidade e a outras que ainda não conhecem, mas são mobilizados a conhecer. Por fim, a professora e pesquisadora acredita em um educador comprometido com a equidade, a justiça e a transformação social: “Precisamos de educadores que tomem as diferenças e a diversidade como valores que enriquecem as experiências de aprendizagem e atue conscientemente para que elas não se convertam em desigualdades na sala de aula ou fora dela”, pontuou.
Educador do futuro: domínio dos dados
Nos últimos meses, o relatório da Unesco sobre impactos da tecnologia na educação e o grande movimento das escolas com restrições a celulares e uso de telas tem movimentado as pautas sobre tecnologia e educação. Mas, afinal, qual é o papel da tecnologia na escola? A tecnologia é meio ou fim? Provoca desigualdade ou pode ser uma aliada para o ensino e para a diversidade? Outro tema latente são os dados e algoritmos no meio educacional. Como gerir os dados dentro da escola? Como utilizá-los a favor de um ensino mais significativo e acessível a todos?
Essas são as perguntas que os educadores do século 21 estão fazendo cotidianamente. E que Graziella Matarazzo, coordenadora da Escola Castanheiras, tentará responder em sua palestra na Bett Brasil 2024. Graziella dividirá com Fábia Antunes, diretora da Escola Lourenço Castanho o painel com tema “Aprendizagem Significativa: Tecnologia para quê? Dados para quê?”. “Nesse encontro, vamos mostrar algumas estratégias de organização do currículo de tecnologia e uso dos recursos na escola que podem garantir um melhor aproveitamento dessas inovações. A proposta é inspirar os educadores a buscarem as tecnologias como aliadas para o ensino significativo e para diversidade”, antecipou.
Graziella Matarazzo acredita que, após acompanharem essa conversa, os educadores serão desafiados a repensar suas práticas através da ótica da geração e consumo de dados nos ambientes educacionais e utilização significativa da tecnologia como ferramenta, conteúdo e apoio pedagógico. A educadora acrescentou que as diretrizes nacionais têm respondido a essa questão do papel da tecnologia na escola abrindo espaço para um currículo de tecnologia, habilidades e conteúdos a serem trabalhados em sala de aula. Mas reconheceu que as políticas de acesso e conectividade reforçam que a tecnologia acentua a desigualdade embora mostre o caminho para combatê-la.
“O mais importante, então, é compreender as potencialidades dessas ferramentas e desses conteúdos e utilizar tudo isso a favor da aprendizagem. Nas estratégias de ensino híbrido, por exemplo, os dados são essenciais para que o objetivo da personalização seja atingido”, argumentou, acrescentando que adotar plataformas que são expostas na Bett, por exemplo, dão ao professor relatórios completos das jornadas de aprendizagens dos estudantes, e não utilizar esses recursos para aprimorar o planejamento e os objetivos pedagógicos além dos planos individuais é subutilizar recursos de aprendizagem.
A Bett Brasil 2024 acontece de 23 a 26 de abril, em São Paulo, no Expo Center Norte. O educador21, mais uma vez, é apoiador do evento e parceiro de produção de conteúdo da Bett Brasil.